Ao final do Encontro Nacional ente as Comissões Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Comissão Justiça, Paz e Integridade da Criação da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), realizado em Brasília (DF), de 10 a 12 de novembro, foi divulgada mensagem pública na qual denuncia “lógica cruel, incapaz de sentir qualquer remorso com a dor de milhões” em curso no Brasil.
De acordo com o texto, tais ações no âmbito do Poder Público são constantemente tratadas como responsabilidade fiscal, “verdadeira adoração ao mercado e desprezo pelos pobres, mulheres, negros, jovens, desempregados e indígenas”. As comissões demonstraram a firmeza de que “esse quadro atual de grandes perdas e de ameaças a direitos, não abala a nossa fé na democracia pois o golpe que atingiu o nosso país não é invencível. A força da militância dos movimentos populares, irá demonstrar, mais cedo do que se imagina, como em outros momentos da história, que as tiranias sempre sucumbem à irresistível vontade popular”.
Confira a Mensagem na íntegra:
Mensagem pública aprovada pelas Comissões Justiça e Paz da CNBB e a Comissão Justiça, Paz e Integridade da Criação da CRB, que formam a Rede Brasileira Justiça e Paz, reunidas em Brasília, de 10 a 12 de Novembro de 2017
Misericórdia e fidelidade se encontram, justiça e paz se abraçam (Salmo 85, 11)
A realidade brasileira expõe uma nação à deriva, sem rumo, entregue à voracidade do mercado financeiro nacional e internacional. Há quem sustente que esta situação revela algo premeditado e com objetivo claro: aprofundar o modelo de país voltado para fora como fonte de matérias primas oferecidas às metrópoles de plantão.
Tal anomalia tem uma funcionalidade, pois legitima a adoção de políticas que, num quadro de normalidade, jamais seriam aceitas. Ao explorar o vocábulo crise, implicitamente induz à admissão de que o Estado Democrático de Direito ainda subsiste e não estaríamos caindo em outra realidade, um novo formato de Estado, voltado à multiplicação de lucros e ampliação do controle penal dos “indesejáveis”, em negação de valores essenciais à própria humanidade.
É dentro desta perspectiva, que se explica a interminável necessidade de buscar a desconstrução dos instrumentos de governança e inclusão social, que desde 1930 deram sentido à nacionalidade brasileira, apesar dos inúmeros limites e percalços que não podem ser olvidados.
Há poucos meses foi decretado o fim da CLT, medida que acaba de entrar em vigor, ousadia que nem o arbítrio de 1964 foi capaz de propor. O atual Presidente da República comporta-se sem cerimônia e desprovido da “liturgia do cargo” para enterrar as denúncias que pesam contra ele e seus mais próximos auxiliares. Para tanto, faz uso indevido de nomeações, verbas e distribui privilégios que o mau manejo da máquina pública proporciona, em escandalosa cooptação de parlamentares e parte majoritária da mídia empresarial.
O discurso oficial apregoa que teríamos entrado num lento, porém virtuoso processo de retomada do emprego, da renda e da atividade econômica. Tal aceno, choca-se com a sensação real de instabilidade institucional, pobreza crescente e enorme desemprego. É preciso lembrar que as medidas de “contenção de despesas” destinadas à área social acoplam-se à permanente drenagem desses recursos desviados para o infindável pagamento de inaceitáveis juros da dívida pública.
Essa lógica cruel, incapaz de sentir qualquer remorso com a dor de milhões, é constantemente tratada como responsabilidade fiscal, verdadeira adoração ao mercado e desprezo pelos pobres, mulheres, negros, jovens, desempregados e indígenas.
Tal quadro desolador se completa com a hipertrofia do judiciário, nem sempre distante das paixões políticas presentes na sociedade. Aliás, muitos se perguntam se ele não estaria em algum grau partidarizado e comprometido com o modelo econômico neoliberal que se quer impor ao Brasil. Afinal, atribui-se a um dos ministros do STF a inaceitável expressão “a Constituição não cabe no orçamento”.
No campo da sociedade civil está presente forte e difundida oposição à implementação desse modelo, entretanto sem a força necessária às mobilizações, em parte fragilizadas pelo risco do desemprego que coloca os movimentos dos trabalhadores na defensiva, em parte, pela ausência de uma proposta de luta clara, exequível e unificada.
A esperança que anima a nossa militância tem mantido acesos movimentos, redes e mobilizações. Por isso, nossa resistência tem sido capaz de impor o recuo do governo em questões como a da Renca, da insidiosa portaria que legitimava o trabalho escravo, bem como da cada vez mais improvável Reforma da Previdência.
Esse quadro atual de grandes perdas e de ameaças a direitos, não abala a nossa fé na democracia pois o golpe que atingiu o nosso país não é invencível. A força da militância dos movimentos populares, irá demonstrar, mais cedo do que se imagina, como em outros momentos da história, que as tiranias sempre sucumbem à irresistível vontade popular.
Carlos Alves Moura
Secretário Executivo
Comissão Brasileira Justiça e Paz
Ir. Maria Inês Vieira Ribeiro
Presidente
CRB Nacional – Conferência dos Religiosos do Brasil