Os presidentes do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), dom Miguel Cabrejos Vidarte, e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Walmor Oliveira de Azevedo, concederam na manhã da sexta-feira, 13 de maio, uma coletiva de imprensa sobre a atualidade do Documento de Aparecida, fruto da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano realizada no Santuário Nacional de Aparecida, de 13 e 31 de maio de 2007.
Em referência ao Papa Francisco, o presidente da CNBB ressaltou que “Aparecida não é um evento do passado, não é um documento que se esgotou, mas um desafio e uma interpelação muito atual para a Igreja na América Latina e Caribe e também uma inspiração para a Igreja no mundo inteiro”.
O arcebispo de Belo Horizonte (MG) destacou que o Documento de Aparecida fala, no início, dos discípulos e discípulas missionários. “A nossa Igreja precisa oferecer às pessoas, o que é uma grande insistência do documento, a formação para sermos autenticamente discípulos e discípulas missionários. Isto se não faz apenas com o olhar para a realidade para dizer o que ela é, às vezes até de modo agoureiro; não com um olhar para a realidade para tratá-la analiticamente, mas com um olhar de esperança”, afirmou.
Sobre a pandemia, o presidente da CNBB afirmou que os cristãos que fazem a experiência importante e bonita do discipulado, como missionários de uma fé autêntica partindo de Cristo, serão capazes de fazer brotar esperanças, devolver alegrias e ter uma palavra que console os corações, não como acomodação mas como mística profética, para que as pessoas apostem na vida em plenitude.
De acordo com dom Walmor, o Documento de Aparecida tem respostas riquíssimas para este momento que está sendo vivido pela Igreja no continente com desafios que parecem, às vezes, intransponíveis. “Por exemplo, há um capítulo sobre a alegria da qual nós temos falado. A pandemia trouxe muita tristeza por causa dos muitos fracassos e o acirramento de lacunas que sempre experimentamos em nossa sociedade brasileira. Atingiu também muitas famílias. São muitos os mortos e muitas famílias enlutadas. Portanto, a alegria cristã é uma possibilidade de acender uma luz no coração de todos os homens e mulheres”, avaliou.
“Deus nos ajude como Igreja no Brasil, na América Latina e Caribe na participação de todo povo de Deus, como discípulos e discípulas missionárias para que possamos avançar nesta hora grave na história da humanidade, com problemas sérios na sociedade brasileira. Nós, com Cristo, temos uma grande contribuição a dar”, ressaltou.
Aparecida e o Sínodo 2023
Dom Walmor também apontou as contribuições da experiência da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano para o processo do Sínodo 2023. “Celebrar os 15 anos de Aparecida, e revisitar de maneira contemplativa, orante e reflexiva o seu documento, ajuda-nos a encontrar no caminho bonito que o Papa Francisco nos convoca, de celebração do Sínodo dos Bispos 2023, semelhanças com o caminho que já estamos percorrendo.
“Aparecida indica práticas sinodais nascidas da experiência do encontro pessoal e comunitário com Cristo. Tudo a partir Dele. Porque sinodalidade não é organização meramente, não é instituição meramente, sinodalidade é experiência de comunhão e participação fortalecendo a missão. Não se pode ter comunhão na Igreja e nem ser uma Igreja de comunhão no coração do mundo senão a partir da experiência do encontro pessoal com Cristo que é uma tônica, fundamental, no documento de Aparecida”, pontuou.
A Igreja e as polarizações presentes na sociedade
Um assunto que apareceu com muita ênfase nas questões levantadas pelos jornalistas foi a polarização presente na sociedade brasileira. Para dom Walmor onde se vê polarizações, se vê irracionalidades e falta de clareza nos julgamentos. Como saída, o presidente da CNBB apontou ser necessário à Igreja investir na formação dos cristãos católicos para que compreendam que antes dos emocionalismos e posicionamentos político-partidários, é necessário iluminar as mentes e corações com a força do amor e de Deus.
“Por isto, o olhar do discípulo missionário é muito importante, porque do contrário nós corremos o risco de escorregar nos preconceitos, nas disputas, nos fundamentalismos, nos radicalismos, e isto não vai levar a nada. E a nossa Igreja está convocada a contribuir muit0. Não para indicar candidatos, mas no sentido civilizatório e evangelizador que precede esta escolha”, apontou.
Dom Walmor apontou que o Documento de Aparecida fala da política com a compreensão de que fora dela não é possível construir uma sociedade justa e fraterna. “Precisamos, como diz a Encíclica Fratelli Tutti, de uma ‘política melhor’ com vistas ao bem comum. Enquanto Igreja precisamos ajudar nesta compreensão, criando sensibilidades na perspectiva ecológica e social. É preciso muito diálogo em torno da sensibilidade que o Evangelho nos mostra com os pobres, com os sofredores e com a casa comum”, disse.
O presidente da CNBB disse que a polarização impede de ver a verdade e coloca as pessoas numa posição de se defender atacando, prática que apontou como não é cristã. “Reler o documento de Aparecida é se deixar banhar por uma espiritualidade que vai nos fazer sair destas polarizações e considerar as diferenças como riquezas e nos tornar capazes de oferecer uma palavra de Esperança. Mesmo como diferenças, podemos sentar numa mesa, dialogarmos e não rifarmos o sentido do bem comum”, disse.
Dom Walmor afirmou que o que está faltando é gente com competência humanística e espiritual. “Quem tem competência humanística sabe dialogar, articular as diferenças, escutar, opinar, abrir caminhos, dar novas respostas. Quem não tem, e falta espiritualidade, ataca, simplesmente se entrincheira, se põe contra e não é capaz de ter lucidez”, disse.
Desafios da Igreja na América Latina
O presidente CELAM e arcebispo de Trujillo (Peru), dom Miguel Cabrejos Vidarte, apontou que as polarizações não são apenas um fenômeno do Brasil mas que se repetem em todos os países da América Latina e Caribe.
“Estamos tentando responder, enquanto Celam, ao magistério pontifício mas também os desafios de hoje”, disse. De acordo com ele, um dos desafios, é a formação de políticos que trabalhem para o interesse comum e não em vista de interesses particulares. “Uma coisa fundamental é compreender o poder como serviço”, pontuou.
O presidente do CELAM também falou sobre os desafios da comunicação da Igreja e a estruturação, no organismo, de um Centro de Comunicação. Ele ressaltou a importância da articulação de redes de ação pastoral e de comunicação e citou a experiência da primeira Assembleia Eclesial da América Latina e Caribe como uma expressão deste salto de comunicação dado pelo Conselho Episcopal. “Mais de mil pessoas se conectaram não apenas pela técnica mas em torno de um verdadeiro diálogo”, avaliou.
Para ele, é necessário que a Igreja se cerque de especialistas da comunicação, sobretudo da comunicação virtual, para avançar mais, conseguir ir além da transmissão de conteúdos e estabelecer um diálogo autêntico. Ele disse que o CELAM está ampliando os meios de comunicação mas que ainda falta muito. “Depois da pandemia, não há um caminho de volta. Estamos combinando metodologia de trabalho presencial e virtual”, disse.
Dom Walmor pontuou que, desde o início, a atual presidência da CNBB escolheu três eixos, entre o quais “A comunicação estratégica e o diálogo com a sociedade”. O presidente da CNBB disse que em termos de comunicação, a Igreja Católica no Brasil é um gigante mas se não avançar na articulação será como um gigante adormecido. “Avançamos muito, mas precisamos avançar mais para fortalecer a evangelização, com um cuidado com os conteúdos, respeitando os diferentes carismas”, disse.
Dom Miguel destacou que Aparecida vive e está presente em todo o contexto pastoral da América Latina e Caribe. Para resumir, citando uma frase do Papa, ele disse que Aparecida tem muito o que ensinar à Igreja Universal.
“O Celam tem tentando responder ao magistério do Papa com um processo de renovação e restruturação do organismo. Assumiu os grandes eixos: desenvolvimento humano e integral, ecologia integral e Igreja em saída. E agora, outro eixo importantíssimo, a comunhão e a sinodalidade”. Neste sentido, o presidente do Celam apontou o surgimento da Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), como um esforço pastoral para fortalecer o sonho eclesial de uma Igreja com rosto amazônico.
Como desafios pastorais apontados por Aparecida que ainda precisam ser melhor trabalhados, o arcebispo de Trujillo (Peru) apontou a importância da vida missionária, a opção preferencial pelos pobres, conforme apontada pelo Papa Bento XVI como um traço do coração de Cristo, a sinodalidade como exercício já vivido em Aparecida, uma nova organização do poder a partir do povo e o conceito de discípulos missionários. A referência da centralidade da Palavra de Deus para a missão e para ser discípulo missionário foi reforçada como um desafio a ser melhor trabalhado pelo presidente da CNBB.
No vídeo, abaixo, a íntegra da Coletiva de Imprensa:
Fonte: CNBB