O Paraná abriga a maior comunidade de descendentes ucranianos do Brasil. São aproximadamente 600 mil pessoas, das quais mais de 90% são católicas. Sendo assim, para atender essa população, é natural que no Paraná estejam as sedes duas Eparquias Ucranianas: a Metropolia São João Batista, em Curitiba (PR), e a Eparquia Imaculada Conceição, em Prudentópolis (PR). Elas fazem parte da Igreja Católica como uma Igreja Particular, uma Diocese, e seus bispos integram a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), mais particularmente, o regional Sul 2.
Diante da situação dramática de guerra que a Ucrânia vive, o regional Sul 2 da CNBB divulgou uma entrevista com o arcebispo da Metropolia São João Batista, dom Volodemer Koubetch, sobre a Igreja Católica Ucraniana no Brasil, sua organização, as características dos seus fiéis e sobre como estão vivendo esse momento triste de sua história.
Dom Volodemer, como se organiza a Igreja Católica de Rito Bizantino Ucraniano aqui no Brasil?
Hoje, nós temos duas Eparquias: a Eparquia Imaculada Conceição, em Prudentópolis-PR, criada em 2014, e a Arquieparquia São João Batista, ou Metropolia como a denominamos, com sede em Curitiba-PR. A Eparquia São João Batista já tem 50 anos de história e foi elevada a Arquieparquia, ou Metropolia, em 2014, com a criação da Eparquia em Prudentópolis. A maioria das nossas paróquias está aqui no Paraná, mas temos também uma paróquia na Zona Leste da cidade de São Paulo e três paróquias no norte de Santa Catarina.
Somos uma Igreja Greco Católica Ucraniana, que hoje é governada pelo Arcebispo Maior Dom Sviatoslav Shevchuk, com sede na capital da Ucrânia, Kiev. Mas, como Católicos somos submissos ao Bispo de Roma, o Papa, e aqui no Brasil, pertencemos à CNBB, tendo maior contato e colaboração aqui no Regional Sul 2.
Como o senhor recebeu a notícia dessa guerra que se iniciou na Ucrânia?
A gente recebeu com muita tristeza. Tristeza é a melhor palavra para expressar o sentimento deste momento tão dramático para a Ucrânia e para o mundo. Até o Papa Francisco, em seu apelo, usou a palavra tristeza. Mas, com esse sentimento vem outros de dúvida, de medo, de angústia, de decepção, de indignação, de revolta. É um momento chocante e muito dramático para o povo ucraniano e para toda a humanidade.
Tivemos notícias de que nosso Arcebispo Maior, dom Sviatoslav Shevchuk, junto com outros sacerdotes, teve que se esconder no subsolo da Catedral da Ressurreição, em Kiev, quando começaram os bombardeios. Até achávamos que, com essa crise, ele iria fugir para Roma ou outro lugar, mas ele decidiu ficar e pediu para que todas as igrejas permanecessem abertas para acolher as pessoas que vierem buscar ajuda.
Quais os interesses por trás dessa Guerra?
É poder, é dinheiro, é influência. Os analistas, especialistas e historiadores tem dito que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, pretende restaurar o império da antiga União Soviética, que tem uma história ainda mais antiga, o Império Russo. É isso que Putin quer: influência, poder, territórios. Ele quer de volta todos aqueles territórios que pertenciam à antiga União Soviética e quer evitar que a União Europeia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) se estendam mais, por isso quer evitar a todo custo que a Ucrânia entre para a Otan e a União Europeia.
O povo ucraniano já passou por outras guerras e isso o caracteriza como um povo de resistência
Sim, é um povo de resistência, de sofrimento que vem de longa data, que já sofreu muito durante a guerra, que teve muita gente eliminada. Depois, é um povo que sofreu nos países de imigração. As coisas não foram fáceis em nenhum lugar, mesmo em países desenvolvidos como o Canadá e os Estados Unidos, os ucranianos sofreram. Porém, como é um povo resistente, forte, de luta e de fé, eles conseguiram evoluir na vida, prosperaram, tanto é que hoje em dia a maioria tem um nível bom de vida, inclusive aqui no Brasil. É um povo resistente e de muita fé.
Outra característica forte é que o povo ucraniano conserva ao máximo a sua cultura, inclusive o idioma ucraniano, que é a mais difícil e complicada. Mas os demais aspectos são mantidos naturalmente, a culinária, o bordado, a pessanka (ovos coloridos, pintados à mão), a iconografia, as danças folclóricas. Também o rito da missa, a Divina Liturgia, é conservado, conforme as exigências canônicas. Quanto à língua, a Divina Liturgia é celebrada em ucraniano, mas, conforme as situações de domínio da língua, ela pode ser celebrada integralmente ou algumas partes em português.
O que a Igreja Católica Ucraniana no Brasil tem feito para demonstrar proximidade ao povo ucraniano?
O que se tem feito é pelo lado da fé e das manifestações populares. Pelo lado da fé, é o contato quanto possível, a proximidade, dar apoio moral e as orações. As manifestações populares são de cunho religioso, cultural e civil, como a que aconteceu na noite de sexta-feira, 25, no Memorial Ucraniano, em Curitiba. É isso o que a gente pode fazer. Eu já mandei uma mensagem ao nosso arcebispo maior dom Sviatoslav Shevchuk e isso repercutiu muito positivamente lá. As pessoas, os fiéis, os bispos, sentem esse apoio moral, diante dessa grande provação que vivem.
A próxima Assembleia dos Bispos do Paraná, nos dias 13 a 15 de março, acontecerá na Colônia Marcelino, em São José dos Pinhais-PR. Esse, certamente, será um momento significativo para a Igreja Católica Ucraniana
Será muito significativo. Primeiro, por valorizar aquela comunidade que é histórica. Estamos celebrando o centenário da visita do Metropolita Andrey Sheptytsky, que foi um dos líderes mais importantes da Igreja Católica Ucraniana, tanto no sentido eclesial quanto civil na Ucrânia, e ele passou pela Colônia Marcelino. Também estamos celebrando os 50 anos de fundação da Eparquia São Batista (desde 2014, Metropolia). Com isso, essa Assembleia dos Bispos terá um sentido histórico profundo, pois vai valorizar a comunidade ucraniana e terá um grande sentido de eclesialidade. Neste tempo sinodal, será uma manifestação de grande sinodalidade na Igreja do Paraná, entre a Igreja Católica Latina e a Igreja Católica Ucraniana. É um momento de alta beleza espiritual e de um testemunho cristão para a própria Igreja, para a sociedade e o mundo de hoje, que precisa de união, solidariedade, fraternidade e, principalmente, de paz.
Oração e jejum: o apelo do Papa Francisco
A guerra é uma coisa diabólica e para vencer satanás, vencer o mal, como disse Jesus aos apóstolos, é só com oração e jejum (cf. Mt 17,21). Então, o Papa Francisco, como tem um senso muito concreto e muito prático da vida e da espiritualidade cristã, está recomendando isso num dia que já é de penitência, de oração e de jejum. Ele está pedindo isso a toda a Igreja, nesse contexto de conflito e de guerra lá na Ucrânia atacada pela Federação Russa.
Por Karina de Carvalho, do regional Sul 2 da CNBB
Fonte: CNBB